E o ano de 2014 começa com despejos em São Vicente

No terceiro dia do ano de 2014, quatro casas de moradores de uma ocupação na área continental foram demolidas na cidade de São Vicente. Segundo a prefeitura, elas estavam em Área de Preservação Ambiental Permanente, e como de praxe todos os aparatos de um despejo estavam presentes: Secretaria de Habitação, de Obras, de Meio Ambiente, também a Defesa Civil, Polícia Militar, Ambiental, Guarda Civil Municipal e Codesavi (Companhia de “Desenvolvimento” de São Vicente). Esta operação, segundo o secretário de Habitação, Emerson Santos, teve como objetivo coibir e não permitir a expansão dessas invasões. (Notas da Prefeitura sobre a ação do dia 03 e do dia 07)

Essas ocupações vêm explodindo pela região nos últimos anos, e por isso, cabe a reflexão sobre essa política de coibir. Há muitos significados por trás dela, temos que aguçar nossos olhares, afinal, historicamente a maior parte da área continental é de ocupação. Próximo a este local em que foram retiradas estas casas, há mais umas duzentas e poucas, ou seja, há mais um bairro em processo de desenvolvimento na base da ocupação mesmo, porque é assim que funciona (infelizmente ou felizmente). Sem esquecer que, desde que Martim Afonso aqui chegou, tudo, absolutamente tudo é área de invasão. Inclusive sua casa e a minha.

ocupac3a7c3a3oilegal(Este local onde há esse bairro em desenvolvimento, é conhecido como Fazendinha e fica na Vila Ema, e faz algum tempo que um suposto proprietário reivindica seu direito pelo terreno, inclusive, entrou com ação no (MP) Ministério Público, que pediu soluções à Prefeitura – o caso arrasta-se).

(Na Vila Ema, estão sendo construídos 380 apartamentos no Residencial São Vicente II, com recursos do Programa Minha Casa Minha Vida, porém, não  beneficiará estas famílias se houver despejo.)

Foto: Rádio da Juventude

Foto: Rádio da Juventude – México 70 -vista da ponte do mar pequeno.

O déficit habitacional em São Vicente é histórico (sendo a cidade um recorte do resto do país). Por exemplo, a favela do México 70 é toda uma área de ocupação, área de manguezal que pertencia à Marinha, foi ocupada no final da década de 1960, e trinta anos depois, na década de 1990, iniciou-se um processo de organização habitacional por meio de um projeto do Governo do Estado – CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano). Vinte anos depois, ainda é um problema, devido a um modelo de habitação segregacionista.

Foto: Rádio da Juventude - desocupação no Samabaiatuba - SV

Foto: Rádio da Juventude – despejo em março de 2013 no Samabaiatuba – SV

Aí podemos citar também o Dique do Sambaiatuba, outra área de ocupação que pertencia à Marinha, e que se constituiu em outra das maiores favelas de São Vicente, com problemas de todo tipo no que diz respeito a direitos sociais – onde foram construídos três conjuntos habitacionais, que se deterioraram devido à incompetência administrativa municipal, estadual e federal, e, em 11 de março de 2013 o MP (Ministério Público) mandou despejar cerca de 700 familías que haviam ocupado os conjuntos, e a Prefeitura em sua política de vencer pelo cansaço, cadastrou as famílias em programas de habitação em resposta à pressão da mídia oficial que especulou a situação.

Foto: Rádio da Juventude - Conjuntos no Parque Bitarú abandonados.

Foto: Rádio da Juventude – Conjuntos no Parque Bitarú – SV, abandonados. Dinheiro público gasto afundando na lama.

Há outros conjuntos em São Vicente de projetos de habitação seguindo pelo mesmo caminho (logo mais matéria completa a respeito). No Parque Bitarú, conjuntos se deterioram aos poucos, abandonados após terem ficados ¨quase¨ prontos, enquanto há inúmeras pessoas sem ter onde morar. (São 416 unidades com recursos do PAC. Os  beneficiados são os moradores do Dique do Meio e Saquaré, no México 70. Só que não, de acordo com o abandono.

Infelizmente essa é a realidade, a mesma que defende a propriedade privada por meio do Estado, que defende falaciosamente o meio ambiente, mas quando é para construir pátios de container, de produto químico, construir túnel, viaduto, aí não tem problema. O problema é construir moradia para pobres, e o problema mesmo é quando os pobres se organizam e constroem suas moradias! Aí… É despejo, essa é linguagem e a política de habitação que todo governo entende e promove há décadas.

Portanto, em 2014 a política do trator continuará sobre a população pobre vicentina e o sonho de um teto para viver não virá com uma canetada, somente continuará sendo conquistado com luta e organização.

Foto: Rádio da Juventude - Conjuntos abandonados no Parque Bitarú SV

Foto: Rádio da Juventude – Conjuntos abandonados no Parque Bitarú SV

1. Quem puder visitar o México 70 poderá entender melhor o termo segregacionista que utilizamos, pois, lá ainda existe muitos problemas de habitação, inclusive nos conjuntos construídos pela CDHU que supostamente eram para resolver. OBS: As famílias que moram sobre o dique da rua do canal e da rua mecanizada, que são as mais atingidas e residem em condições sub-humanas continuam aguardando promessas da Prefeitura.

Foto: Rádio da Juventude

Foto: Rádio da Juventude – despejo em março de 2013 no Sambaiatuba

2. Nestes três conjuntos do Dique do Sambaiatuba foram gastos 12 milhões, (O dinheiro da obra veio do FAT fundo de amparo ao trabalhador) ficou pronto em 2004, porém, logo foi abandonado pela burocracia e pela incompetência municipal, estadual e federal que em 2005 não sabiam se o projeto iria virar “Minha casa minha vida” ou ficaria como obra do PAR. Em 2007 a CDHU entra como Administradora, mas a obra fica novamente emperrada, porque parte do dinheiro virá do PAC, outra parte do Estado e outra do Município, só que… Nada aconteceu e o prédio continuou abandonado. Com isso, a população foi ocupando e retirando o que precisava. Depois de inúmeras denúncias, agosto de 2010, a Prefeitura de São Vicente e a Caixa Econômica Federal anunciaram que as obras seriam retomadas com previsão para novembro de 2011.  Em 2012 nada aconteceu. Março de 2013 o MP despeja as 700 famílias que residiam no local. Janeiro de 2014 os conjuntos continuam se deteriorando e nada sendo feito.

3. A Prefeitura gaba-se de ter entregado cerca de 1.000 unidades no ano de 2013, mas este é um resultado de anos e risório comparado ao déficit da cidade que segundo o Prefeito Bili está em torno de 20 mil, e com certeza é para mais considerando toda a região periférica de São Vicente onde pessoas vivem em condições sub-humanas. Agora, se todo o dinheiro desperdiçado em obras que terão que ser refeitas, sem contar o dinheiro do PGU que  desapareceu e ninguém sabe onde está, mas aí é outra matéria, fosse repassado direto para organização popular de moradia, com certeza muitos problemas já teriam sido resolvidos, correto?