O avanço tecnológico tem permitindo que o acesso à informação democratize de forma rápida o conhecimento num processo de ruptura que tem repautado à ordem da comunicação social instituída. É fato que há anos a hegemonia dos meios de comunicação está nas mãos de grupos sociais que controlam todo o meio; ditando regras e excluindo aquilo que não lhes interessam, contudo, a partir de meados de 2000 com o surgimento de tecnologias digitais; computadores domésticos, máquinas fotográficas, celulares, entre outros, essas tecnologias somadas com a internet propiciaram uma enxurrada de produções cujo conteúdo diverso e plural têm abalado o alicerce destes grupos – os obrigando a repensarem suas pautas e suas estratégias de mercado. Além de que, o universo virtual criou um processo de disseminação e apreensão de conhecimento que rompeu com as barreiras das instituições, a partir disso, uma dinâmica foi sendo configurada alterando a lógica e possibilitando uma nova forma de construir e transmitir conhecimento, de modo que podemos afirmar; comunicar tornou-se um desafio, pois a velocidade da informação neste novo paradigma da comunicação social assume proporções incontroláveis no sentido de descentralizar e de instantaneamente informar.
Hoje, todo cidadão é um agente comunicador e produtor de conteúdo, não mais refém da passividade de mero expectador, inclusive, com a internet há a possibilidade de atuar diretamente em qualquer esfera social disseminando informação ao mesmo tempo em que apreendendo conhecimento e pautando propostas. Fundamental também para a formação desta conjuntura foi o surgimento das redes sociais que aceleraram este processo de rompimento de hegemonia, e o mais importante; permitiram que grupos sociais antes negligenciados, desrespeitados e criminalizados pudessem apoderar-se das ferramentas e se tornar agentes produtores, transformadores e construtores da própria história, questionando e contribuindo com importantíssimas discussões de nossa contemporaneidade;
– Organização social;
– Estado de direito;
– Democracia representativa;
– Instituições;
– Governo
Por exemplo, as manifestações de junho de 2013 reforçaram que todos estes mecanismos cuja existência seria para manter o bem estar da vida em sociedade, na verdade, são frágeis e propensos a funcionarem como aparelhos de controle e manutenção social do Estado, e não dispositivos democráticos que sirvam à população, ao contrário, servem a um pequeno grupo que gerencia nos bastidores toda a política nacional.
Tudo isso, não é nenhuma novidade, mas as redes cumpriram um papel de ampliar a visibilidade, acirrar a discussão e revelar uma sociedade em que a liberdade é limitada pelo mesmo mecanismo que diz promovê-la, de modo a revelar que o Estado é de exceção quando a participação popular radicaliza a democracia, e neste sentido o ciberativismo vem exercendo um papel importantíssimo e revolucionário para a democracia, pois impulsiona mudanças radicais na estrutura social, mesmo com todas as criticas de que o ambiente virtual não é um espaço organizativo, ele já deliberou e pautou mudanças substanciais, por exemplo, o Projeto de lei Ficha limpa foi uma demanda oriunda de mobilização na rede, que promoveu uma petição online e alcançou cerca de um milhão e meio de assinaturas pressionando o poder público e deflagrando num novo mecanismo direto de participação popular. Atualmente a quantidade de petições que chegam ao Ministério Público em que as assinaturas são feitas pela rede, (inúmeras) vão desde pedidos como;
– “Playstation 4, no Brasil, com preço justo!;
– Votação da Lei de Remuneração do Militares;
– Contra o uso de animais pelo Instituto Royal;
– Libertação imediata dos presos políticos de 15 de outubro de 2013 no Rio de Janeiro;
– Mudança do Preço do PS4 no Brasil
Em relação aos casos de violação de direitos humanos é importante frisar que muitos jamais teriam a visibilidade se dependessem dos meios de comunicação tradicionais – o caso do desaparecimento/assassinato do Pedreiro Amarildo no Rio de Janeiro em que a denúncia partiu de uma campanha na rede com a seguinte pergunta; “Onde está Amarildo” e desencadeou todo um processo de investigação que culminou na discussão da desmilitarização da Polícia Militar, debate que já existia, mas que ganhou extrema visibilidade com a campanha virtual, e neste caso, o poder público foi pressionado a responder a pergunta e para isso teve que apurar os fatos, revelando além de um erro atroz, (+) um caso de abuso policial que abriu precedentes de investigação de outros, além de colocar em pauta a real utilidade da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) nas favelas do Rio de Janeiro.
Outro exemplo importantíssimo são as violações de direitos causados pelos megaempreendimentos da copa do mundo no RJ, que vieram a público devido os inúmeros vídeos que se espalharam pela rede denunciando, e em lócus documentando uma das maiores violações de direitos humanos que o Estado Brasileiro foi capaz de promover. “O dossiê do Comitê Popular Rio da Copa e Olimpíadas alerta que cerca de 30 mil pessoas sofrerão remoções forçadas no Rio por causa destes megaeventos esportivos”.
Cabe a pergunta; será que a sociedade brasileira teria acesso a essas informações há uns 20 anos atrás?
Definitivamente as redes são infladas porque existe uma configuração social e uma conjuntura política favorável para o efeito cascata de uma insatisfação coletiva, mas também porque pouco a pouco as pessoas têm percebido que o ativismo digital é tão importante quanto estar numa audiência pública, que a participação política não se restringe somente aos espaços institucionais, ela se articula de forma mais direta por meio dos grupos e subgrupos formados no mundo virtual que destrincha assunto por assunto e busca soluções, resultado: o surgimento do ciberativismo colaborativo que se funda em plataforma mais organizada distribuindo informação por meio de grupos criados na rede que se identificam e fazem circular informação de interesse comum, criando fóruns de debates que deflagram em lutas orgânicas – vide as mobilizações da tarifa de junho onde em todas as redes sociais, as pessoas não paravam de discutir a questão do transporte gerando um fenômeno social que reverberou no país inteiro, onde a rua e ciberespaço se convergiram na “Ágora” pós-moderna. E mesmo com a existência de grupos que tendem a se fechar em suas ideologias e mais uma vez concentrar informação, ou negligenciar alguma informação cujo conteúdo represente ameaça ao grupo, isso não retira a importância de sua totalidade, e este tipo de organização virtual tende a crescer, e o mais interessante, contrariando os apocalípticos – está provocando a reconfiguração política, cultural e social de modo a recriar mecanismos de participação popular. Quais benefícios serão conquistados? Eis a questão, porque;
1. Tramita no congresso há 13 anos um marco civil pela regulamentação da internet; “Lei Azeredo” – apelidada de “AI-5 Digital” uma lei de vigilância a possíveis “cibercrimes”.
2. A partir de 2009 de forma mais democrática iniciou-se via rede um projeto de participação popular, que foi alterado, e que hoje está como pauta do dia no congresso, a conhecida; Lei de Marco Civil da Internet – que quase nada tem de civil, pois não há debate com a população a respeito, na verdade, sua aprovação pode ser um grande tiro pela culatra para muitos ativistas que buscam a neutralidade da rede, mas que não percebem que regulamentação na sequencia abre caminho para uma série de proibições, traduzindo: uma Agência será criada para fiscalizar, controlar e decidir pelo usuário, será o fim do anonimato na rede – quer dizer, não tem nada de neutralidade, de proteção, é sim um atentado à liberdade de expressão que irá atingir diretamente os movimentos sociais.
3. Com ou sem regulamentação, muitas ações contra ativistas já foram promovidas, basta incomodar alguém.
Ou seja, a tal liberdade virtual tem suas fragilidades e cedo ou tarde passará pelo crivo da lei, afinal, mesmo sem regulamentação há casos de perseguição, citamos o Rio de Janeiro com a greve dos professores – entre setembro e outubro – que ocorreu casos polêmicos, inclusive de atentado à liberdade e à democracia, onde ciberativistas mapeados pela polícia civil na rede facebook foram presos em suas casas e tiveram pertences subtraídos; computador, celular, pendrive entre outros, e acusados por crimes de incitação à violência pela rede, formação de quadrilha e corrupção de menor, houve até acusação de pedofilia de um rapaz maior de idade por namorar uma jovem menor.
Portanto, o ambiente virtual é fundamental e vai continuar quebrando os monopólios da comunicação e contribuindo muito com a democracia, todavia, neste processo muitos ciberativistas serão presos, até empiricamente compreenderem melhor o buraco negro que é a web, e que somente se apropriando das ferramentas livres¹, que esse embate pode ser travado com maior segurança.
É neste sentido que o ciberativismo com toda a pluralidade e diversidade de assuntos, tem contribuído exponencialmente para fortalecer e dar visibilidade as diferentes esferas de grupos sociais – porém, a internet não é um espaço realmente livre, tudo nela é monitorado; as redes sociais, as contas de e-mail, os blogs, os sites, os canais de vídeo, de áudio… E essas ferramentas são as utilizadas, de forma que mapear e desestruturar uma organização na rede é muito fácil, basta incomodar como fizeram os ciberativistas do Rio de Janeiro, não é sem propósito que uma das brigas do governo na lei de regulamentação da rede (Marco Civil na Internet) se refere às estruturas de armazenamento, gerenciamento e disseminação de dados, obrigando as empresa instalarem os “datacenters” em território nacional, como se isso evitasse a espionagem estrangeira, na verdade, só cria um meio de acesso rápido do governo às contas dos usuários (além do balão de ensaio para eleições de 2014). Por isso, nenhuma rede social é um local seguro para os movimentos sociais exporem suas estratégias de luta. Além de que, estes espaços concedidos “supostamente” gratuitamente, não são, e a todo o momento uma ação na justiça irá determinar a censura de algum conteúdo, a TV Globo, por exemplo, possui vários pedidos na justiça para bloqueio de vídeos, áudios e matérias de conteúdo julgados por ela como depreciativo à emissora, e nesta correlação de forças, os juízes em maioria têm decido a favor dela, ou de qualquer outra corporação midiática. Eis o embate – desigual – entre os grupos que monopolizam a informação e os grupos que rompem paradigmas comunicacionais, e neste processo a democracia se refunda num movimento de embates de ideologias – luta de classes – onde a democratização dos meios de comunicação é mais que uma necessidade, é também uma urgência social que deve ser amplamente discutida com toda a sociedade, pois é um debate que a ela pertence.
É histórico, quem detém o meio, detém a informação, e detém o controle social – ter o controle é ter poder, e numa sociedade de organização capitalista nada mais indubitável que a luta de classes também esteja presente na comunicação social, estabelecendo disputas pelo poder dos meios que está intrínseco a manutenção da cultura de massas, cuja finalidade é manter a indústria de entretenimento (político e cultural) funcionando para continuar lucrando e manipulando – de modo que, tudo é negócio e todos somos mercadorias, não importa os direitos sociais, se eles não estiverem alinhados a política econômica de mercado. Por isso, a discussão em torno de regulamentação da rede é muito mais uma urgência de quem está perdendo o controle (dinheiro e poder politico) do que uma necessidade da população, ou de quem está subvertendo e contribuindo para as mudanças sociais, e neste sentido os ativistas digitais estão cumprindo um papel fundamental de rompimento deste paradigma de controle e poder, descentralizando a informação e fortalecendo as lutas por direitos sociais, cabe a eles neste processo continuar impulsionando este debate, principalmente pela autonomia e pela apropriação do poder político para além dos espaços formais e institucionais, de forma a romper com a lógica de que somente é possível intervir quando estamos inseridos diretamente dentro de uma esfera de poder público, ou, por meio de um partido, pelo contrário, inúmeras são as provas de que é possível subverter a lógica monopolista da comunicação social sem precisar estar atrelado a estas vias. O ciberativismo em seu curto espaço de tempo tem revelado isso – espaços se ocupam construindo novos espaços, que disseminam informação/conhecimento que contribui para recriar novos instrumentos de participação popular – organismos diretos em que as pessoas realmente possam se apoderar das discussões da vida pública e decidir, não apenas delegar.
1. Referimo-nos aos programas de software livre, que a maioria das pessoas desconhece e que podem desempenhar um papel crucial, tanto em proteção como o de fortalecimento das lutas sociais, por ser um instrumento livre, que não está nas mãos de um grupo hegemônico, cujo compromisso, é apenas com o lucro.
OBS: A internet é um dos maiores meios de comunicação que existe, mas 53% da população brasileira ainda não utiliza a rede – dados divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) de maio de 2013.