Por Nayara Teixeira
A exploração econômica das fontes de petróleo e gás no Brasil vem produzindo para a população, por meio dos grandes veículos midiáticos, a impressão de que estamos vivendo ou prestes a viver processos de grande desenvolvimento e bonança econômica no país. Recentemente a Região da Baixada Santista tornou-se foco de atenção com as descobertas de fontes de petróleo e gás na camada do pré-sal na Bacia de Santos e com sua exploração a partir de 2009. Experiências como a da região litorânea do Rio de Janeiro (Bacia de Campos), centradas na cidade de Macaé, contudo, servem de exemplo para mostrar que os impactos destes processos podem ser desastrosos para a maioria da população, desmascarando e colocando em xeque o significado deste tão propalado “desenvolvimento”.
Macaé é uma cidade em ebulição. Nos últimos dez anos sua economia crescer 600% e sua população aumentar em mais de 50% (IBGE). Subiu de 55ª para a 8ª cidade no ranking de participação dos pequenos municípios no PIB nacional. Sua renda per capita anual é de R$ 120.612,00. Em 2006 a cidade recebeu R$ 413.116.830, 41 em royalties e participações especiais. O Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) apontou a cidade como a que mais se desenvolveu na última década no eixo Rio-São Paulo. Macaé está entre as cidades que mais formalizaram trabalhadores, tendo hoje 26% dos empregados com carteira assinada ganhando mais de dez salários mínimos. Tem o segundo maior parque hoteleiro do estado. Seu setor de turismo de negócios cresce de 6% a 9% ao ano, e corresponde a 71% do setor e a 10% do PIB do município (Fonte: Centro de Memória Antonio Alvarez Parada).
O município vem desde a década de 70 com o início das explorações, passando por muitas transformações. Hoje apresenta invejáveis indicadores de riqueza e crescimento econômico e grande investimento em áreas da educação e infância. O desempenho econômico da cidade e a invasão de pretodólares, contudo, não acompanha o investimento no seu crescimento estrutural e o município sofre com as conseqüências de um crescimento desordenado, não planejado, desigual, e sua deficiência generalizada na prestação de serviços públicos e disponibilização de equipamentos comunitários – a Prefeitura conta com 17 mil funcionários e apenas 8 mil são concursados estatutários1. Dados do Censo mostram que Macaé chega a receber uma população flutuante superior a 30 mil pessoas. Todos os dias 5,6 mil visitantes desembarcam na cidade, sendo 14% de origem estrangeira. Em geral chegam à cidade a trabalho, ganham seus dólares, vão embora sem investir no município. Muitas multinacionais que se instalam na cidade já trazem seus profissionais de fora.
Dentre os principais impactos locais sobre a cidade estão2:
- Invasões em áreas de risco e de Preservação Permanente
- Surgimento de favelas e de bairros periféricos sem infraestrutura
- Aumento das demandas por serviços públicos
- Aumento da violência – tráfico de drogas
- Aumento do custo de vida
- Especulação Imobiliária
- Trânsito – Média de 25 mil carros e 700 caminhões/dia
Impactos nos serviços públicos:
Saúde – Hospital Público Municipal (HPM)
- 50 mil atendimentos de urgência em 2010
- Atendimento às populações de cidades vizinhas e de acidentados na BR
Educação
- Cerca de 3 mil novas vagas/ano no ensino fundamental
- Investimentos para manter 50/116 escolas da rede municipal em tempo integral
- Investimentos em ensino técnico e superior
- Manutenção de serviços de transporte universitário
Social
- Ampliação permanente da rede de assistência social
- Investimentos para implantação de restaurantes populares
- Ampliação constante de programas sociais voltados para gestantes, crianças, idosos, mulheres, dependentes químicos, moradores de rua e deficientes físicos
Infraestrutura
- Demanda para: Habitação, equipamentos públicos e saneamento
Outros riscos e impactos ambientais
- Vazamentos em alto mar
- Manipulação, transporte e disposição de resíduos perigosos
Outros riscos e impactos ambientais (cont.)
- Utilização de substâncias radioativas
- Impermeabilização de grandes áreas
- Desmatamento e ocupação de Áreas de Preservação Permanente
- Introdução de espécies exóticas no ambiente marinho
- Perda de identidade cultural
Impactos na pesca
- Atividade que mais sofre com a atividade offshore
- Sísmica
- Abalroamentos de traineiras
- Perda de redes
- Atração do pescado para áreas de exclusão junto às plataformas
- Descarte de resíduos orgânicos
- Pesca em área de risco
- Modificação do ambiente marinho
A experiência da Bacia de Campos já reúne subsídios suficientes para um planejamento mais inteligente e responsável, para que não se arruínem atividades econômicas tradicionais, não se formem bolsões de pobreza nos municípios produtores, não se degrade o meio ambiente, não se exclua o cidadão comum dos benefícios desta atividade, não deixe de fora aspectos importantes como os impactos nos municípios provocados pelos processos migratórios, desemprego, especulação imobiliária, aumento do custo de vida e da demanda por serviços públicos, crescimento desordenado e a retração da atividade pesqueira, experiência que reúne subsídios que devem ser considerados em um, infelizmente improvável, planejamento estratégico do pré-sal (Fernando Marcelo Tavares).
Da mesma forma como aconteceu com a Bacia de Campos nas últimas décadas, com os municípios a reboque de decisões estatais e empresariais sem nenhuma ingerência nos fatos, está acontecendo com o pré-sal, apesar de contar com disponibilidade de tempo para os planejamentos e adequações necessários, atualmente desperdiçado com polêmicas infrutíferas como as que têm sido travadas a respeito dos royalties (Fernando Marcelo Tavares).
Com a experiência de Macaé e da região do Rio, os movimentos sociais da Baixada Santista tem em mãos a oportunidade de refletir a sua própria condição e organizar sua capacidade de enfrentar esta corrida ao ouro que vem atender aos interesses de uma classe sempre privilegiada pelo desenvolvimento capitalista. Como interferir na lógica do maior lucro a partir da destruição e marginalização, fazendo valer os nossos interesses de povo? Como resistir?
SEMINÁRIO POPULAR DA BAIXADA SANTISTA – 5 E 6 DE NOVEMBRO DE 2011
REFERENCIAS: Centro de Memória Antonio Alvarez Parada / Os Dois Lados na Nova Macaé. Keisy Bossan Moraes / Nota 13: Impactos sociais do desenvolvimento da atividade de exploração e produção do petróleo (…) norte fluminense. CTPETRO / Oficina sobre Impactos Sociais, Ambientais e Urbanos das Atividades Petrolíferas – o caso de Macaé (RJ), realizada pelo Instituto de Ciências Humanas e Filosofia (ICHF) da Universidade Federal Fluminense (UFF), em Niterói, entre 7 e 9 de dezembro de 2010.